quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Motivações ocultas

Poderia citar uma dúzia de razões pra ver a série The Walking Dead. Começando com uma certa fixação pelo tema zumbis - que deixaria Lacan meio cabreiro. Gosto também do Frank Darabont, que dirigiu o piloto e produzia a série até a segunda temporada. Agora, na terceira temporada, justo no momento que tudo se passa num presídio, o Darabont (que dirigiu À espera de um milagre e Um sonho de liberdade, dois clássicos de prisão) caiu fora ou foi tirado. Aliás, um parentese, quando o George Lucas anunciou que tinha recusado duas propostas de roteiros do Darabont pro novo Indiana (esse da caveira de cristal) e assumido a história, dava pra prever a tragédia.

Além dos zumbis, gosto também do tal futuro apocalíptico. Talvez porque acho que estamos indo por aí mesmo, mesmo sem os zumbis - o que é uma pena (a ausência dos zumbis, não o apocalipse, esse é merecidão). Mad Max, A estrada e os filmes do George Romero deixaram sequelas, admito.

Mas a verdade nua e crua - aqui bem mais crua do que nua - é que quando a coisa tava meio sonolenta na segunda temporada, com os sobreviventes numa espécie de hotel fazenda, longe dos zumbis e discutindo relação, eis o que mantinha minha fidelidade:


Depois de uma temporada e pouco nem sei o nome do personagem ou da atriz. Deu trabalho procurar a foto. E as coisas começaram diferente nessa terceira temporada, com zumbis a rodo, nem precisaria de motivações adicionais, mas cada vez que aparece essa moça aí mais eu renovo minha fé num futuro apocalíptico. Com zumbis e, principalmente, com ela.
Aqui a moça em ação, prontinha pra encarar mortos-vivos. Sai da frente Serra.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Topo e base

Um partido ou coalizão de partidos que governa do topo e para o topo - grosso modo os 10% mais ricos mais uns 20% de classe média bem alta (incluindo aí os colunistas da imprensa) - vai, necessariamente, tornar a vida de 70% da população muito pior. Com o tempo os 30% do topo, mesmo beneficiados, vão ser obrigados a se refugiar em ilhas de proteção, mega condomínios fechados, veículos blindados, escolas particulares ultra caras, shoppings de luxo, segurança privada.... Esse cenário, claro, não é novidade no Brasil, tem sido o padrão dos diversos governos e partidos. Foi a opção clara de governo do PSDB de Fernando Henrique Cardoso e seu principal aliado, a Arena/PFL/DEM. 

Além de um governo pros amigos, os ricos, tem aqui uma teoria política que diz que um governo deve ajudar os mais ricos e assim eles - os ricos - vão puxar o crescimento dos demais. Conversa fiada, claro. Beneficiada por reduções de impostos (ou olhos pouco rigorosos do leão da receita) e juros altos, a elite se aproveita pra aumentar os investimentos sim - mas não na produção, gerando empregos, mas no consumo de luxo, nas viagens pra Europa/EUA, nos carros importados caríssimos, e isso gera muito pouco de emprego ou recursos aqui pro Brasil. Isso tudo parece bastante óbvio, mas não é o que se costuma ver pelas explicações dos analistas de sempre, os que defendem e vão continuar defendendo as políticas que privilegiam os mais ricos - e jurando de morte quem tentar se meter nisso.

Lula se meteu e mudou isso no final do primeiro mandato. Com todos os problemas do Partido dos Trabalhadores, seu governo mudou a direção da bússula e passou a tratar dos 70% sempre deixados pra escanteio no país.  Com um conjunto de ações, como o bolsa família, aumento do salário mínimo, os programas como o minha casa minha vida e outros tantos, Lula colocou milhões de brasileiros, que antes não tinham condições pra comprar nada, agora incluídos na chamada nova classe média, classe C - e com isso movimentou a economia interna enquanto lá fora o mundo caia em crise. Não é por acaso que nos governos do PSDB o Brasil entrava no furacão quando uma marolinha aparecia lá longe, na Ásia. Governando para o topo o país não criava um mercado interno, dependento sempre lá de fora pra quase tudo. Lula inverteu isso e o furacão da crise lá fora resultou na marolinha aqui dentro (e não vi  ninguém da imprensa reconhecendo o erro quando Lula falou isso no começo da crise). 

Governando também pros 70% mais pobres o PT melhorou a vida de 100% dos brasileiros. Ou quase, tem muita gente lá no topo que não gostou de ver pobre melhorando de vida - e nunca vai gostar.  E olha que Lula nunca mexeu com esses 30% no topo, manteve os juros altos, continuou sustentando os grandes grupos de mídia, deixou a Veja falar todas as merdas de sempre.

Esse é o ponto importante - a melhora do país inteiro a partir do cuidado com a população mais necessitada -  e é o que escapa das pessoas que lotam as caixas de e-mail com campanhas tolas contra o bolsa família, Prouni, cotas e qualquer auxílio do governo aos mais pobres. Se não me engano o Jornal Nacional mostrou como denúncia uma família que recebe uma bolsa auxílio comprando geladeira e fogão, tipo vê se pode, folgados. Nunca vão entender nada. Quem entendeu foi o metalúrgico semianalfabeto, não o doutor em sociologia. Lula fez exatamente o que o intelectual FHC sabia que tinha que ser feito prum governo social democrata, mas não teve coragem de fazer. Ficou preso nos limites de classe (diria o Lukács),  nos estigmas da elite incapaz de olhar pros mais pobres.

Além disso vai ser preciso que se passem algumas gerações, mantido o caminho de justiça social, pra que os muros que dividem o mundo dos ricos e pobres comecem a cair de verdade e que a violência finalmente diminua - numa sociedade, vamos lembrar, fundada pela injustiça da escravidão, depois na miséria da maior parte de seus cidadãos e da violência em todos os lados.

Vai demorar, mas pelo menos começou. E quase ninguém da Folha, Globo ou Estadão vai tratar disso. Vão continuar tentando derrotar o cara como se a questão toda fosse o Lula e apenas isso. Lula e o PT cometeram muitos erros, mas governar pros 70% da base e não somente pros 30% do topo tá longe de ser um deles.

PS - Um dos erros do Lula e do PT é não deixar claro pra população que um governo que trabalhe pros 70% da base é um governo de esquerda, enquanto um governo que fica só no topo, com seus 30%, é de direita. Essa é uma das grandes diferenças entre esquerda e direita e ao não deixar isso evidente o PT corre o risco de ver a coisa personificada no Lula. Ou seja, outro cara, mesmo de um partido de direita, poderia fazer também. Sei dos problemas "marqueteiros" com o uso e os significados de termos como esquerda e direita. Sei do peso que carregam e que o eleitor não tá muito disposto a esse debate. Mas fugir dele, como até aqui tem fugido o PT, é correr o risco dum direitoso falar pro povo que vai fazer igual ao Lula, pra depois devolver tudo pros 30% do topo. Olha o susto com o Russomano aí.



segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Como funciona parte 1: zumbis


Não, não é autoajuda pro elenco do The Walking Dead. Nem sei bem como qualquer coisa funciona, mas como todo mundo tenho meus palpites, incluindo aí sobre como nascem os zumbis - além das mordidas infeccionadas. Vamos lá: um candidato manjado, desses que disputam toda eleição desde o nascimento da democracia grega, vinha duma derrota no segundo turno pra presidente, tá agora com mais de 50% de rejeição do eleitorado de São Paulo. Muita coisa errada o cara fez, certo? Se botar nessa conta o apoio acrítico e entusiasmado de quase todos os que se acham formadores de opinião, põe coisa errada nisso pra alimentar tanta antipatia, mesmo com uma exposição, vamos dizer, amigável (dentro do possível pra figura, que não é muito simpática) nos meios de comunicação. Por mais medíocres que sejam, os analistas da grande imprensa, esses mesmos que ficaram na moita até aqui esperando o resultado da campanha suja do candidato, agora apontam, cheios da razão e da autoridade, com ar de eu já sabia, que a adesão do tal candidato às coisas da extrema direita não pegou bem num eleitorado que, mesmo conservador na maior parte, não quer ficar escutando baboseiras preconceituosas ou deixar religião conduzir o debate o tempo todo numa campanha duma cidade que está na merda.

Veja bem, não quer dizer que esse eleitor não ache um erro fazer um material que trate de homossexualismo pra ser distribuido nas escolas, pras "nossas crianças",  ou que ele seja a favor do aborto, da união civil de pessoas do mesmo sexo....Pode até concordar com os religiosos que vivem martelando contra essas coisas, mas ele não acha esse tipo de coisa o tema principal duma eleição quando ele não consegue se locomover dentro da cidade, seja de ônibus ou de carro, quando ele se sente ameçado dia e noite por bandidos e pela polícia, quando não consegue atendimento na rede pública de saúde. E começa a ficar meio de saco cheio dum cara que só aparece falando mensalão, mensalão. Tirando meio dúzia de cabeças privilegiadas, como o próprio candidato, a pequena sônia (ela não era adversária?) e um cara da veja, é meio que consenso que as escolhas de pauta e a postura do cara não foram felizes. Bom, com tanta rejeição, na verdade as escolhas foram uma porcaria mesmo - e, pra piorar mais a coisa toda, repetiram as mesmas escolhas da derrota anterior pra presidente. No mundo real, dos vivos, o papo furado não cola - ou pelo menos não cola tanto quanto seria necessário pruma eleição majoritária. É uma pauta de candidato a vereador ou deputado.


 O candidato do PSDB a prefeitura/governo/presidência de alguma coisa.

Já na campanha de 2010 o cérebro do candidato mostrava todos os sinais da prolongada ausência de oxigênio e o tecido morto começava a tomar o lugar do tecido vivo.  O que se dizia dele, economista conceituado, administrador experiente, desenvolvimentista, não batia com o que ele falava ou fazia na prefeitura ou no governo do estado. O que se viu foi polícia dando porrada em todo mundo, principalmente em pobre e estudante (estudante pobre então, sifu). E só. A única argumentação exposta pelo cara da "biografia" era "trololó petista" como explicação ou resposta pra qualquer sinuca de bico. O sintoma mais claro de que a vida como conhecemos já se ausentava ali era a sindrome de biruta de aeroporto. O cara vinha caminhando pra lá e pra cá conforme o vento, sem idéias novas, sem programa, procurando um cérebro pra devorar, num típico zumbi dos filmes do Romero. E procurando cérebro pra devorar não é apenas figura de linguagem, mas o modo de conduta dos ultracons que cercam o zumbi. Sempre raivosos, querendo sangue, olhos atentos procurando sinal de vida inteligente pra atacar. Talvez tentando, com isso, dar vida aos próprios registros de atividade cerebral já apenas no traço do eletro.

É o Serra ou Zé? Defende o que aí está na cidade mas se ausenta sempre que a coisa fica feia. Fala mensalão, mensalão, mensalão, mas ataca quem tocar no assunto mensalão do seu partido. Vai na parada gay mas se deixa apoiar por renomados homofóbicos como o Silas Malafaia. Xinga o que chama de kit gay do Haddad embora tenha lançado um quase igual. Nunca mostrou ser particularmente religioso e agora abraça com fervor tudo quanto é padre e pastor. Critíca o aborto e, como é típico da elite, sua mulher fez. Se coloca sempre no papel de vítima de baixarias enquanto sustenta sites pra difamar adversários (incluindo aí mentiras sobre cancelamento de Enem ou propostas de aumento de tarifas num site falso simulando ser da campanha da Haddad). Até a FOX News, A FOX NEWS, cobra do candidato republicano quando a coisa é muito descarada. Aqui não. Silêncio, grilos ao fundo. É exatamente esse tipo de véu que protege Serra (e o PSDB) que ajuda a entender (daí o titulo pretencioso do post) os motivos deste candidato continuar "prestigiado", dos tucanos não se renovarem - bom lembrar que havia um processo de prévias tucanas pra escolha do candidato a prefeito que foi destruído por Serra com aplausos gerais da imprensa. E assim o morto-vivo continua mandando.

O fraquíssimo Fernando Rodrigues, da Folha, deu a dica de como se processa a armadilha ideológica que sustenta os mortos-vivos. Em sua coluna, já com a vaca do seu candidato atolada até o chifre no brejo, reclama da baixaria. Tudo bem, tem razão mesmo. Mas reclama da baixaria dos dois candidatos, e põe o Malafaia no meio, como se fosse coisa dos dois - quando um respondia aos ataques do Malafaia. Além de desonesto é, como aliás tem sido o caminho da Folha, apostar na estupidez geral. Se um candidato tem mais de 50% de rejeição e tá quase todo mundo mostrando que as opções deste canditado pela baixaria não produziram resultado (incluindo aí o Fernando Henrique Cardoso - que também convenientemente espera bastante pra dar esse típo de diagnóstico) não dá prum analista colocar essa baixaria na conta dos demais candidatos. É falsear os fatos, dar salvo conduto pra campanhas feitas só de ataques tolos e propostas zero.

A ombudsman da Folha pede que os jornalistas não se pautem pelos marqueteiros - e ficar tratando de bobagens o tempo todo, deixando de lado as questões graves da cidade. Tarde demais dona. Os colunistas da Folha (não só, mas são os que ainda aparecem no meu computador) já não sabem falar nada diferente do padrão marqueteiro. Não é apenas complô, o tal PIG, mas é parte da formação dos jornalistas e de outros profissionais confundir propagando com fatos, como torcedor que se recusa a ver os defeitos do seu time e, em contrapartida, aceitar na boa tudo que o favorece, incluindo penalti roubado. Propaganda e jornalismo têm muita coisa em comum, partilham técnicas e ferramentas de comunicação e partilham também cada vez mais o mesmo espaço e a necessidade de agradar os donos do dinheiro que ainda mantém os jornais na ativa. Isto, claro, não é de hoje e vem atuando na formação e seleção dos "melhores" currículos pelas chefias de redação, estes que ganham espaço e importância nas coberturas de imprensa com análises sem profundidade, rasteiras mesmo, com preguiça de cultura (essa tal erudição que pra muitos só toma tempo do que importa mesmo, dinheiro) mas que contam pontos preciosos com os "de cima". Não dona Singer, mantido esse padrão de cobertura e nível de jornalismo não dá mais pra separar jornalista de marqueteiro. A finalidade é a mesma, vender algo.

Uma imprensa com um pouquinho só de dignidade, pra não dizer inteligência e algum, nem precisa muito não, espírito crítico, já teria decepado a cabeça do morto-vivo muito antes pela sua absoluta falta de sucesso em se comunicar com o mundo dos vivos. E isto não seria nenhum passo à esquerda, mas o contrário, é liberar um pouco de oxigênio pros pássaros bicudos respirarem e não transformar tudo em zumbi como tão fazendo. Não tenho nenhum interesse em dar receitas pra direita (até por que ela tá bem viva, apenas fora do poder formal no planalto, mas longe de não ser hegemônica), mas com essa cobertura engana-trouxa montada pra classe média mais imbecil (ou assinante/sócio/torcedor) que a imprensa se especializou (ou fez um MBA, na linguagem da moda) - vide mensalão - tá duro de ver alguém com aparência saudável nos lados do PSDB. E olhando o nome minas-leblon que se propõe pro lugar até aqui cativo do zumbi, tá mais pra candidato de reallity do tipo rehab do que político sério. Vão ter que criar um novo kit zumbi pra sustentar mais um candidato que, por si só, não para em pé (diferente dos postes).

Resumindo, em números, desses que afetam a vida dos vivos (como emprego, aumento do salário, moradia) o Brasil tá melhor do que estava antes de Lula. Isso é um dado concreto (IBGE, Dieese), goste-se ou não. Pode ser com algum mérito do FHC, pouco mérito do FHC (tô nessa), mas ao invés de pensar em como melhorar ainda mais esses números e, em consequência, a vida dos vivos, a joint venture entre partidos de oposição e imprensa fica exclusivamente (e exaustivamente) dedicada a promover e sustentar zumbis, combatendo exatamente os fatores (como queda dos juros, fortalecimento das empresas estatais e programas de redução de pobreza) que ajudaram a construir esses números melhores. É a política feita por e para zumbis, que descaracteriza e ataca a vida - e a tragédia de Pinheirinho tá aí pra mostrar como funciona. São estes zumbis que diante da complexidade duma disputa política com um governo muito bem avaliado, só sabem berrar petralhas, petralhas (e agora mensalão, mensalão). Acho que o cérebro já foi comido faz tempo.

PS - Acabei de ler um texto muito bom do Paulo Moreira Leite - outro dos raros que mostra-se mais interessado em compreender do que escolher um lado e ficar martelando pensamentos prontos - que fala dessas generalizações cheias de interesse da imprensa quando seu candidato perde. Ele pega as conclusões apressadas dos analistas a partir dos números altos de votos brancos e nulos em SP. Diz a ladainha destes analistas que isso mostra uma falha da nossa democracia, problemas de representatividade, questionam a apatia do eleitor, pedem mudanças....só porque perderam. O Paulo Moreira Leite mostra que ninguém no comité do Haddad tá reclamando da democracia. O problema é que o Serra não empolgou, não conseguiu os votos que precisava. A apatia foi dos eleitores do Serra que não queriam votar no PT mas  não aguentam mais o zumbi. O problema é do Serra, do PSDB e de seus apoiadores ultracons na imprensa, não da democracia.

PS 2 - Manchete do Uol no day after da derrota do Serra pro Haddad: Em discurso, Serra mostra disposição, analisa Josias. E vamos nós. Pega lá o kit zumbi Josias.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Tiririca na cabeça do Fiúza

Confesso que nunca fui muito com a cara do escritor Guilherme Fiúza. Quando do lançamento do filme Meu Nome Não é Johnny (o livro é dele) o cara apareceu aqui e ali, incluindo a invasão bem sem sal em alguns dos meus sagrados programas filosóficos preferidos - conhecidos pelos demais mortais como mesas redondas de futebol. Sempre aquele arzinho blasé de quem faz muita força pra falar com os outros, os não abençoados com seu brilho intelectual. Nem sabia que era desses ultracons, mas dava toda pinta e mantive distância segura desde então. Agora soube que escreve as tolices usuais do nosso tosco conservadorismo na revista Época (esses ultracons sempre encontram abrigo nas Organizações Globo, coitado do Paulo Moreira Leite), daquelas que os donos de tudo sempre falam quando os eleitores votam em quem melhora suas vidas e não em quem eles mandam votar.  Como não acompanho as colunas do moço, não dá pra cravar muita coisa, mas li a coluna recente onde ele agride os eleitores de São Paulo por votar no Haddad, chama de palhaçada, termo dele, comparando ao voto no Tiririca. No mais a coluna é um desfile de argumentos daqueles de cientista político de facebook - a privatização da telefonia foi boa pra todas as classes e com o PT nunca teria acontecido, Dilma não fez nada até aqui...e o mensalão (o do PT, claro, e só o do PT) é a maior tragédia do universo, nada no mundo pode continuar igual depois do STF julgar o mensalão...Ufa. Esses caras, como o Madureira, a Soninha tão com muita raiva, muita mesmo. Uma coisa digo, deve ser muito mais fácil ganhar a vida nesse ramo "colunista antipetralha coolzinho", é só dar control c em uma coluna dum desses notórios filósofos e colar nas colunas todas nos meses seguintes, variando um ou outro bordão. O bordão que Fiúza acrescentou ao léxico ultracon - acho, não fico lendo esse pessoal - é comparar Haddad ao palhaço Tiririca. Confesso que não tenho nenhuma raiva do Tiririca, disputou uma eleição e foi eleito. Tá cheio de gente que não disputa eleição, nunca dá cara a tapa, mas quer mandar no povo. Também não sou chegado em carteiradas acadêmicas, tipo o cara é professor doutor, pesquisador A do CNPQ com o Lattes.....Não é esse o caso, comparar o semialfabetizado palhaço com o professor doutor e ex ministro da educação. O caso é justamente que essa comparação seja feita e que pra alguém isso signifique algo. Fiúza pega alguns signos óbvios e reconhecidos - mensalão do PT, todo mundo com celular na mão, Tiririca - e conduz suas comparações pelo rumo que crianças de 12 anos comparando seus times de futebol preferidos tomariam. Se - pro Fiúza e seus brothers - quem votou no Tiririca é um tonto, que tal tentar mostrar que quem vota em Haddad é tonto igual? Vai que cola. Sei que depois dessa vou reler algumas colunas do Elio Gaspari, passar um paninho na coleção de livros dele sobre a ditadura aqui na estante.  Não concordo em quase nada com o Gaspari, que é conservador e antipetista ferrenho, mas não é o Fiúza. E isso é um mérito muito grande nesse mundo lotado de intelectuais sofisticadíssimos como o Fiúza. Acho que sou mesmo um vira-lata que não entende nada de intelectual ou de sofisticação. Prefiro o Tiririca ao Fiúza.

PS - Sobre Dilma não ter feito nada nesses dois anos, imagino que pra pessoas de elevado nascimento (como diria um autor de fantasia) não seja muita coisa, ou nada mesmo, peitar os Armínios do sistema financeiro e seu Banco Central pra começar a mudar o histórico de duas décadas de juros altos que manteve reféns FHC e Lula, tirando dinheiro dos trabalhadores pra aumentar a fortuna de banqueiros e outras pessoas bem nascidas. Não, pra intelectuais refinadíssimos mudar isso é nada. Ou é bem pior do que nada, daí a raiva toda.

PS 2 - Dei um google no Fiúza pra saber um pouco mais da figura e o resultado não foi muito animador, acho que vou ter que retirar o intelecutal refinadíssimo, mesmo na ironia. Mais do que o próprio googlado apareceu uma socialite dum reallity desses, Narcisa sobrenome (preguiça de escrever). Não sei se é namorada ou o que, sei que não é bom sinal prum intelectual, mas acontece, tem coisas que não dá pra controlar. Vamos em frente. Além do Johnny, publicou também uma biografia do Bussunda e parece que está fazendo ou fez uma do Gianecchine. Esse pessoal deve ficar duplamente puto com o Bial. Primeiro por apresentar o BBB, deve dar uma baita inveja. Depois por ter feito a biografia chapa branca do Marinho. Isso deve ter doído nesse povo louco pra achar um biografável famoso e poderoso pra chamar de seu (e vender um monte, e aparecer um monte no Jô, no Gentili, no programa de variedades das tardes da Globonews, no Redação Sportv...). Não tá fácil salvar não, reconheço.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Sintomas

Falando das soninhas e madureiras da vida, são tantos os exemplos de jovens supostamente esquerdistas que "amadurecem" - ou seja, viram reaças de fazer inveja ao Malafaia, que já deixei alertados algumas pessoas próximas que se, depois dos 40 (que estão chegando), eu começar a mostrar alguns dos seguintes sintomas, favor mirar e atirar bem na cabeça que o corpo já não me pertence.  É sério.

1) Começar alguma frase com: até que nisso a Lúcia Hippolito tem razão. Variações com Merval, Jabor, Leitão, Cantanhêde....também devem ser finalizadas rapidamente.
2) Dizer sobre qualquer coisa envolvendo manifestações de jovens: são tudo baderneiros.
3) Falar a palavra empreendedor a sério.
4) Começar a usar no meio de frases em português - com cara afetada - termos como case, bullet point, budget, briefing, turn over, hands on, hobby box, conference call, sponsor, stakeholders, brainstorm, work station...e outros inglesismos que tentam afastar pobre da conversa e simular algum tipo de erudição - criando uma lingua feia em português e sem sentido em inglês.
5) Continuar ouvindo o U2 e, detalhe importante, concordar com o Bono em alguma coisa.
6) Ameaçar votar em alguém do PSDB.
7) Dizer que o CQC é ótimo e eles não perdoam ninguém.
8) Protestar contra algum ato do MST, tipo ahh mas ali não deviam ter invadido, ou coisa assim.
9) Iniciar qualquer argumentação com "eu pago meus impostos".
10) Ameaçar votar em alguém do PSDB.
11) Achar que a Folha tem pluralidade de opiniões.
12) Acreditar que o/a ombusdman da Folha quer realmente arrumar alguma coisa importante lá dentro.
13) Dizer que a política de cotas vai acabar com o mérito ou vai criar o racismo no Brasil.
14) Achar o Eike Batista um gênio;
15) Achar o Luciano Huck um cara inteligente.
16) Acreditar que o Ronaldo quer algo além de ganhar dinheiro em qualquer coisa que faça.
17) Carregar um exemplar de Você S/A.
18) Citar um pensamento fantástico do Shinyashiki.
19) Ameaçar votar em alguém do PSDB.
20) Chamar o Magnoli de pensador.
21) Acreditar que juro alto e corte dos gastos públicos é austeridade.
22) Assistir o Jornal Nacional e não cair na risada diante das caras sérias do casal que apresenta quando vão mostrar alguma denúncia semanal contra o PT.
23) Pedir prum juiz do STF que seja presidente do país. Assim, simples. Concordo com a postura dum juíz num julgamento, logo...ele tá pronto pra ser presidente do Brasil. Fácil.
24) Começar a procurar o biotipo das crianças na escolas pra identificar ali os futuros marginais.
25) Pensar, depois do enésimo incêndio numa favela de SP, "puxa, que pessoal descuidado".
26) Acreditar mesmo que o fim da distribuição de sacolinhas de plástico no supermercado resolve alguma coisa no meio ambiente - enquanto dá uns trocados pro menino do Pão de Açucar botar tudo no bagageiro duma mega SUV (um dos três carros da família) que você usa até pra ir na padaria que fica meio quarteirão da sua casa - e joga uma tonelada de poluição no céu da cidade.
27) Apagar a luz por uma hora na tal hora do planeta e ir dormir sossegado, com a consciência limpa, "fiz minha parte".
28) Falar bem alto pra todo mundo ouvir na frente dum pedinte que não dá esmola pois isso incentiva a vadiagem, e já contribui com uma ong....
29) Contribuir com ONGs .
30) Pedir o Bernardinho do volei pra presidente (mesmo raciocínio do item 23, ganhou uma medalha na olimpíada, logo...)
31) Colocar um adesivo "não reeleja ninguém" no seu blog e se achar uma pessoa muito politizada.
32) Xingar o Chico de tudo quanto é nome porque ele ganhou o Jabuti, achando que é o maior agitador cultural, assinar um manisfesto online pra ele devolver o prêmio, sem nem saber quem é o Edney Silvestre (que ficou em 2°) e só ter lido na vida Pai rico pai pobre, O monge e o executivo ou Mulheres são de algum planeta e homens são de outro (ou algo parecido) e ter achado que os autores destes livros foram injustamente ignorados pelo Nobel (que deve ter sido dado pra algum petralha).
33) Ameaçar votar em alguém do PSDB.
34) Achar natural um show em homenagem ao Brasil e apresentado pelo Luciano Huck, com Luan Santana como atração principal, realizado em Angola, país de língua portuguesa, se chamar Brazilian Day.
35) Achar natural qualquer coisa apresentada pelo Luciano Huck, com Luan Santana, sem Luan Santana, Ivete Sangalo, Claudia Leite....os de sempre.
36) Pedir o Bernardinho do volei pra técnico da seleção brasileira de futebol.
37) Levar voleibol a sério.
38) Levantar a mão direita aberta pra cima com a palma da mão virada pra frente e, com o maior entusiasmo, pedir "give me five".
39) Escrever algo e colocar kkkkkk, huauhuauhuau, rsrsrsrs depois (esse ítem tem peso dobrado e deveria ter sido o item 1).
40) Ler editoriais da Folha, Estadão e O Globo.
41) Ler qualquer parte dum jornal do Grupo RBS. Mesmo os classificados.
42) Assistir o Jornal das 10 na Globonews ao invés do JN e achar que é muito mais aprofundado.
43) Tomar um gole de vinho, fazer aquela cara de sommelier e começar a discorrer sobre as notas cítricas presentes na bebida, com tons de especiarias, sabor aveludado e uma presença marcante de alguma coisa que sabe-se lá de onde tira..... E depois comer algum troço e elogiar a harmonização com a bebida.
44) Prestigiar um desses famosos - ou qualquer um - "atuando" como DJ.
45) Explicar qualquer coisa - dum novo sistema operacional de computador ao funcionamento da sociedade de castas na Índia - com alguma citação do Steve Jobs

(continua)

PS -  Se eu apresentar alguns destes sintomas. Plural. Mais de um. Viu moça, você mesmo, não vai aproveitar pra atirar na minha cabeça só porque eu assobiei Sunday bloody sunday.

Maduro, madureira, imaturo

Numa coisa eu e o eleitor carioca Marcelo Madureira concordamos no que ele escreveu na Folha (22/10) defendendo o voto no Serra em SP: ele perdeu a graça. Não é de hoje e dá até pra precisar o momento: meados de 2006. Enquanto o Brasil perdia a Copa na Alemanha o Casseta perdia seu humor e seu rumo com a morte do Bussunda. E os moleques rebeldes e engraçados dos 80 viraram essa coisa que se materializa na forma do Madureira, um típico general de pijamas, velho, chato e reaça.

Diz o humorista ao final do texto tão sem sentido quanto o candidato que defende: "caramba, nunca escrevi tão sério! Deve ser influência do Serra".

Sim, concordamos nisso também, a seriedade e também o humor do Casseta tão sob influência da seriedade e do humor do Serra.

PS - Pensei em sugerir ao Madureira que, perdida a causa em SP, leve seu brother pra fazer política no Rio, mas além de ser um comentário meio óbvio e sem graça, é evidente que o Rio não merece. Já pensou? Globo, Malafaia, Madureira e Serra.

sábado, 20 de outubro de 2012

pequena sônia

Disse num post anterior pra botar o microfone longe dos técnicos de futebol durante as partidas pra evitar os palavrões. Agora leio que a ex-jovem, ex-esquerdista, ex-vanguardista e atual pequena sônia, e cada vez menor, xingou de filho da puta o canditato do PT que a derrotou na disputa pra prefeitura de SP. Ela disputou mesmo? Os eleitores não perceberam. Ou, como ela mesmo disse, só percebem a moça quando ela xinga. Seguindo a receita dos técnicos de futebol, melhor deixar os microfones (e teclados do computador) longe da moça pra não ouvir/ler merda. Não o palavrão merda, mas a quantidade de bobagens que essa moça diz. 

O pessoal costuma ficar meio assustado diante da metamorfose da pequena sônia, de liberal tipo verdinha, salvem o mundo e fumem maconha, com pitadas de esquerdismos aqui ou ali, pruma ativista da Ku Klux Klan. Esse percurso não deveria espantar ninguém. É regra, não exceção por aqui. Basta olhar as manifestações públicas dos ex-garotos rebeldes de outrora. Não há nenhuma conversão, apenas o uso meio confuso, na juventude, dos estereótipos do jovem descolado que luta contra tudo (sem ferir muita coisa). Isso garante popularidade - ou alguém acha que os membros da juventude tucana que andam por aí de roupinha social e cabelo penteadinho falando todos os clichés do mundo corporativo vão ser tratados como popstars? Não, pra isso é preciso buscar os signos do inconformado, com problemas de adaptação mas que luta dentro do mainstream pra conquistar um lugar. Pega bem. Mas é só isso. 

De esquerda mesmo, como entendo, pautada na luta pela justiça social, essas pessoas nunca chegaram perto. Apenas percorrem alguns movimentos estundantis, seminários, um livro do Marx (talvez, eles dizem, mas duvido), programas cool na TV, partidos políticos - fases, sempre esperando o momento da verdade, do "amadurecimento", de abraçar publicamente o que nunca renegaram, o dinheiro. Não digo aqui grana no bolso pura e simples, acho que nem é o caso e é mais complexo do que só isso. Mas o lado escolhido na "maturidade" é, sem supresa, o dos donos de tudo.

Sim, eu sei, o PT também "amadureceu" no processo de alianças e entendo perfeitamente quem, à esquerda, ataca o partido. Mas xingar petista pra apoiar fervorosamente o Serra, o PSDB, as políticas de higienização, o favorecimento dos carros (de preferência de luxo) em detrimento do transporte público, a homofobia e toda sorte de preconceitos dos Malafaias...e, fundamentalmente, apoiar tudo o que fizeram em Pinheirinho? Não, obrigado. Deixo pra pequena sônia e pro rogério ceni. Isso seria tranquilizar minha consciência esquerdista e por a conta nas costas de quem já tá fudido, dos miseráveis, de quem apanha e morre por causa das políticas tucanas. Sem enxergar as estruturas de dominação, pessoas como a pequena sônia ficam vagando, hora aqui, hora ali, boiando na superfície, rumando conforme o vento. Vale a pena perder tempo não. Merda, já perdi meia hora do meu.

O Problema não é a soninha. Isto é banal. O problema é o Plínio.

PS - Sobre a questão do dinheiro como motivador, tem muita gente por aí publicando uma tabela com uma lista dos parentes da soninha vinculados, sem concurso, a administração tucana-kassab, incluindo aí os valores recebidos. É bastante parente, incluindo aí a própria, com uma boquinha de conselheira da Cetesb, desses cargos que o cara vai numa reunião vez ou outra e embolsa um belo dim dim. Ajuda a entender o "destempero" da moça. Ajuda a entender também as cruzadas éticas seletivas da imprensa, como mostra o Paulo Nogueira no seu Diário do Centro do Mundo, que achou esse tipo de informação de interesse público, mas procurou e não viu nada na Folha. Mas aparelhamento do Estado pelo PT ele achou um montão de coisa.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Nonsense

Armínio quer que o Banco Central se explique. Não concorda com a queda dos juros. O que não precisa de nenhuma explicação - pro Armínio e pros jornalistas que falam sempre o que Armínio pensa - é um BC que por quase vinte anos (FHC e Lula) inventou uma das mais altas taxas de juros do planeta pra corroer nossa produção industrial e transferir bilhões em dinheiro da população mais pobre e da classe média pros....banqueiros, como....Armínio. Não, isso não precisa de explicação. Pobre Auric Goldfinger que tentou honestamente assaltar o ouro do Fort Knox nos EUA. Aqui somos muito mais sofisticados. Goldfinger  não precisaria de nenhum plano pra penetrar nos nossos cofres, poderia facilmente ser indicado pra presidência do BC, como Armínio foi. E, como Armínio descobriu, os lucros são muito maiores e, de quebra, ao invés do risco de enfrentar a justiça (ou o James Bond), ainda poderia passar o resto da vida posando de honesto gênio das finanças, o cara da austeridade. E acusando na Folha o desonesto atual ocupante do cargo de tentar, imagina só, atrapalhar a chegada das garrafas Dom Perignon safra 69 às mesas (na temperatura correta, 8-10°) dos honestos e austeros gênios das finanças que presidiram anteriormente o BC. É ou não o plano perfeito?

Putz acabei de dar a idéia pro verdadeiro filme-livro Assalto ao Banco Central. Mas acho que esse ninguém vai querer filmar.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Traíras, toupeiras e Smiley

No post sobre Bond versus Bauer falei da dificuldade dos roteiristas de 24 Horas em captar tudo que envolve uma das grandes certezas de qualquer boa história de espionagem: traição. Não só de espionagem, claro, mas é obrigatório lidar com traição nas histórias de agentes secretos. A necessidade autoimposta de manter um ritimo maluco de reviravoltas obrigou os roteiristas do seriado do Jack Bauer a tratar uma traição, por mais complexa que seja, na base das caretas dos atores, que passavam em poucos segundos do Mahatma Gandhi prum chefe da Gestapo. As motivações nunca importavam muito, tudo sempre meio óbvio, dinheiro, vingança pessoal....

Mencionei também que um dos produtores de 24 Horas, Alex Gansa, conseguiu aprofundar bastante a questão da traição em outro seriado, Homeland. Acabei de ver a primeira temporada deste e ao menos aqui tenta-se entrar nos motivos que levam alguém a mudar tudo na vida, uma conversão completa - e sem necessidade de caras e bocas dos atores pra mostrar o seu lado no momento (a dupla de atores principais Claire Danes e Damian Lewis acabou de ganhar o Emmy - tudo bem, prêmio americano não é muito parâmetro de qualidade, mas as vezes acertam). Gansa, imagino, deve ter bebido na fonte do escritor John Le Carré que mais do que "mestre da espionagem", num rótulo comum, seria melhor descrito como um ótimo criador de traíras.


Le Carré ou David Cornwell (seu nome real) quando jovem foi agente do MI6 e saiu ou foi saido - parece que vem uma biografia por aí - debaixo do escândalo da deserção de Kim Philby - um dos "quatro grandes", agentes do topo do serviço de inteligência britânico que atuavam como duplos (toupeiras, no jargão) pra KGB no começo dos anos 60. Os outros agentes eram Donald Mclean, Guy Burgess e Anthony Blunt. Esses quatro nomes aparecem com frequência - e boa dose de amargura - nos romances de espionagem - como os do Frederick Forsyth - e devem ter deixado um belo trauma (além de muita dúvida sobre tudo quanto é informação obtida) numa geração inteira de espiões ingleses. Entre os quatro toupeiras não havia nenhum pé-de-chinelo, vinham da elitista Cambridge dos anos 40 e 50, compondo a perfeição o imaginário que moldou a origem do serviço secreto britânico do aristocrata espião lutando pela rainha contra os inimigos do continente. E os quatro, contudo, optaram pela Rússia soviética. Mesmo que apenas num instante, o império decadente que havia resistido aos nazistas caia, aparentemente por escolha, pros soviéticos e isso deve ter marcado bastante o espião David Cornwell mas fundamentalmente o escritor John Le Carré, que basicamente moldou seus livros em função dessa duplicidade inerente a quem se propõe justamente a viver múltiplas vidas. Resumindo, enquanto, na década de 1960, o mundo começava a ver nos cinemas o superespião brintânico infalível e imperturbável no seu patriotismo de Ian Fleming, no mundo real MI6 e MI5 eram piada fora da Inglaterra pela intensa atividade de toupeiras soviéticas no seu quintal de caça a raposa.

Produto direto dessas traições, diferente de Flaming que exorcizava a complexidade com seu espião herói, Le Carré em todos os livros (pelo menos nos que me lembro agora) reconstrói um pouco essa rotina de sombra que deve ter cercado Kim Philby e os demais toupeiras - décadas passadas criando uma lenda, relacionamentos, filhos, amizades, informações, tudo ou quase tudo falso. Não apenas mentira, mas falsificações conscientemente plantadas pra levar seus colegas ao fracasso, incluindo aí a morte de agentes de campo e informantes. Ou seja, o cidadão tem que criar laços de camaradagem pra se ajustar no papel de membro eficiente da comunidade de informações enquanto se dedica, na sombra da sombra, digamos assim, a sabotar os companheiros. Decididamente não é assunto pra reviravoltas relâmpago com caras e bocas de atores fracos. Aqui, nos livros de Le Carré, o problema não é se traiu ou não,  ao estilo machadiano da Capitu, mas quando, como e por quê.

O primeiro grande sucesso de Le Carré foi O Espião que Saiu do Frio e sua criatura mais famosa, George Smiley, aparece brevemente como controlador do agente Alec Leamas, posto "no frio" pelo serviço secreto britânico - ou Circus - após uma operação fracassada na Alemanha Oriental. "No frio", no caso, é simular (não sem alguma verdade) uma punição e pé-na-bunda sem honra concedido pelos empregadores ingleses - e assim atrair uma oferta pra virar a casaca.  Fôlego, vamos lá: o novo trabalho do Leamas então é simular traição pra poder plantar mentiras contra um agente prestes a descobrir um simulado agente duplo agindo pros ingleses do outro lado da mítica cortina de ferro. Ufa. Traição é feijão com arroz neste tipo de história, mas John Le Carré consegue apimentar bastante a coisa e parece lembrar o tempo todo que se a missão daqui é colocar gente falsa lá, a de lá é colocar gente falsa aqui - é parte do jogo.

Se prum típico romance de espionagem o nosso lado é sempre moralmente o mais adequado, deixando aos traídores as caraterísticas degeneradas do assassino frio, do mentiroso (onde todos mentem), do sacana mesmo, pros personagens do Le Carré tudo fica meio embaralhado e é o outro lado que parece mais atraente, moralmente inclusive, como o Magnus Pym de O Espião Perfeito - e sem precisar ser nenhum sociopata. Não parece acaso que os toupeiras de Le Carré sejam sedutores aparentemente ajustados no trabalho e na família, enquanto seus controladores ou caçadores, como George Smiley, são o oposto disso. E é Smiley quem vai protagonizar os livros seguintes.


George Smiley é desprovido de charme pessoal, baixinho, meio gordo (mais pra atarracado) do tipo mais chato do que agradável socialmente. Mas tem grande talento pras coisas do serviço secreto, as rotinas, as análises de personalidade, conferência de dados obtidos em campo, as longas esperas, idiomas e suas nuances, enfim, as coisas tediosas que não são exatamente as que aparecem nos livros e filmes de espião. Smiley é aquele  baita cdf que trabalha horas e horas pra conhecer todos os detalhes duma operação, aquele filho duma puta que deixa todo mundo no trabalho - os "normais", que esperam anciosamente dar 18h pra se mandar - emputecidos por ter de ficar lá no serviço até altas horas levando pastas de arquivos pro tiozinho chato, enquanto na casa de Smiley uma desamparada esposa não se inibe em procurar companhias mais dispostas a ficar na cama do que no escritório - incluindo aí colegas de Smiley.

Por duas décadas, até o começo dos 80, os livros acompanharam esse mundo de Smiley e seu oposto na KGB, Karla. Na verdade não me lembro de ler KGB, MI6 ou CIA nos livros, Le Carré usava  apelidos e jargões pra essas coisas, como Circus, oposição e primos - deve ser coisa de agente mesmo, sei que assim a coisa fluia bem melhor na leitura pois tirava o peso das denominações ultra manjadas, como MI6 e KGB. Smiley não lutava contra a KGB ou contra os soviéticos, mas contra a "oposição" liderada pelo agente de codinome Karla. Assim, por jargões, Karla não era lembrado como inimigo do capitalismo, da liberdade ou outro cliché qualquer, mas era o oponente de Smiley nas tarefas de infiltrar espiões lá fora, localizar os infiltrados aqui dentro e lidar com as informações obtidas.

Não sei se quem só viu o filme do Tomas Alfredson (Tinker, Tailor, Soldier, Spy - 2011) conseguiu dar conta das histórias todas que moviam Smiley na caça ao topeira de Karla com tudo tendo que caber nas duas horas. Mais ainda na relação antiga de Smiley com seu colega - que se revelaria o toupeira - quase seu alter ego, simpático, sedutor e bem enturmado, incluido aí a mulher de Smiley na turma. Como pra efeito de suspense o traidor teria que ficar encoberto no meio dos demais (apesar da velha norma de colocar um ator famoso num papel aparentemente pequeno pra descobrir-se facilmente o vilão) não foi possível aos roteiristas do filme explorar a relação dos dois espiões - o apagado Smiley e o iluminado traíra, ambos veterenos do serviço secreto, entrando quase juntos, disputando os mesmos espaços, construíndo (ou não) as relações e acessos ao topo do Circus. Smiley sempre na sombra do colega. É quase como se Le Carré e seu Smiley sem carisma, eficiente e burocrático perseguisse Ian Flaming  e seu espião brilhante e sedutor e, ao final, Bond/Philby se revelando o traidor.

A caça e a descoberta do infliltrado soviético no Circus na verdade só começava a saga de Smiley como protagonista. Nos livros seguintes ele, hora na chefia hora encostado, teria que lidar com a investigação lenta e trabalhosa da revisão de tudo quanto é informação obtida, sem saber o que foi ou não manipulado pela toupeira, enquanto preparava seu contra-ataque a Karla. Tudo sempre na surdina, sem grandes cenas de ação daquelas que seduzem produtores de cinema - e talvez por isso, enquanto os outros livros de Le Carré já foram filmados, somente agora um cineasta que parece bastante talentoso como o Alfredson (Deixa ela entrar) se propôs a por na tela grande um dos livros do Smiley. Enfim, gosto dessa coisa do Le Carré de tratar sem nenhum glamour algo tão idealizado pelos filmes e livros.

O primeiro livro dele que li - pelo critério democrático de ser um dos mais novos e com capa original da biblioteca - foi A Casa da Rússia, escrito já no final dos 80. Um filme foi lançado logo depois com, veja só, Sean Connery no papel principal - e ele não é o espião, ao menos no começo. Mesmo longe de ser um dos melhores livros, já deu toda pinta desse clima ao mesmo tempo tenso e banal dos agentes secretos. E também do jeito do Le Carré escrever, classudo, fluente e irônico, longe, muito longe dos clichés do bom contra o mal ou dos espiões superheróis - e não falo aqui apenas do Bond (que, no cinema pelo menos, já ganhou um ar de deboche), mas cansei de pegar livro de autor famoso que começa com o agente secreto já mostrando ao mundo sua habilidade física extraordinária, sua mira infalível ou sua espantosa memória fotográfica capaz de registrar a cor dum selo duma carta jogada numa pilha de revistas numa sala depois de ficar 15 segundos na casa. Não, esse não é o mundo dos agentes de Le Carré.

Fui pegando os outros livros, mais velhos e com a capa dura padrão das bibliotecas, e nunca me arrependi de separar um tempo pra ler um livro dele, mesmo os mais fracos como o último que li, O Canto da Missão, de 2006. Acho que, junto com O Jardineiro Fiel, esses livros do Le Carrré onde o personagem principal é um tipico herói do Hitchcock - o homem comum que de repente se vê no meio dum complô de espiões - perde aquela mitologia da guerra entre iguais dum mundo meio paralelo e vira um pouco o ingênuo aprendendo como o mundo é malvado. Prefiro o universo das traições recíprocas de quem sabe onde pisa, das guerras clandestinas, sem muito espaço pro moço ingênuo. Talvez o que eu goste mesmo no tratamento dado aos traíras em Le Carré seja a sensação permanente de que talvez, quem sabe, eu, você, nosso lado, não seja o melhor. As certezas todas ditas e reditas dia após dia podem ser construções ideológicas - no sentido marxista do termo, ou seja, não são mentiras ou apenas mentiras, mas partes da verdade ditas conforme interesse de quem manda, dos donos. Seja uma classe ou um partido.

Sem Smiley e já quase sem guerra fria Le Carré aprofundou-se ainda mais na tentativa de entender os motivos pra alguém mudar de lado. Dois livros são especialmente importantes: O Espião Perfeito e Nosso Jogo. Mas o troço tá ficando meio grande e como não vejo um fim à vista vou dividir em partes.

PS - A propósito, ainda estou me recuperando da "atuação" da atriz que fez a presidenta dos EUA nas últimas temporadas de 24 Horas. Pra contrapor essa interpretação bonzinho-de-repente-malvadão dos outros personagens, mandaram a atriz mostrar toda dor de ter que carregar nas costas o peso da paz mundial, sempre obrigada a tomar as decisões impossíveis. O resultado é uma presidenta que passa o tempo todo com conjuntivite, olhos sempre vermelhos e cheios de lágrimas em qualquer diálogo. Se comesse o tempo todo ia ser presa pela Jack Bauer por uso de substâncias ilegais. O roteiro não se esforçava em entender as nuances da traição e os atores ajudavam menos ainda.

PS 2 - Só pra constar, sobre os Emmys ganhos por Homeland, o seriado acabou vencendo Breaking Bad, que é muito melhor, incluindo aí os atores todos.

PS 3 - Vi agora uns episódios da segunda temporada de Homeland, apesar de ainda tratar bem da coisa da traição, a Claire Danes resolveu que chorar o tempo todo e agir como maluca é a forma de mostrar a luta da personagem contra o transtorno bipolar. Pode até ser mesmo assim, mas torra o saco de quem assiste, já to pulando fora.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Blackberry cansou?

Quando comecei a trabalhar em São Paulo alguns anos atrás fazendo uns bicos, era meio regra nas reuniões nos bairros chiques da cidade o ritual de colocar os Blackberrys na mesa logo no início. As caras sempre com aquela expressão de executivo(a) entediado com mais um compromisso chato e dando uma olhada no smartphone (nem sei se chamava assim antes) prum último contato com o mundo antes do sacrifício. Soube nessa época da fama da Blackberry de simbolizar uma pessoa poderosa, um executivo fodão.

Claro que tudo isso mudou em 2007 com o iPhone da Apple e, na sequência, as toneladas de modelos lançados pela Samsung com telas e preços pra tudo quanto é gosto. De chique e esperto a Blackberry ficou defasada, sistema operacional muito fechado (aí o IOS ganha fácil) e obsoleto, perdeu "agilidade" segundo os críticos, ficou meio gagá. 

Então soube duma megacampanha da marca agora em 2012 pra "reposicionar" a Blackberry de volta no topo, incluindo aí um mercado com potencial como o Brasil. Putz, prum publicitário deve ser meio que um sonho pegar uma marca famosona, que foi até fetiche há bem pouco tempo, com uma boa grana pra criar uma campanha pra dar a cara dessa nova fase fodona da Blackberry, mostrar a força do produto pras gerações mais novas, já meio acostumadas com ipod e iphone - ou seja, Apple - além dos galaxys todos, mantendo ainda uma pose classuda de quem tinha as manhas com os executivos. Material pra criar não faltava. 

E?  E....

Vejo o resultado nos intervalos da TV. O mote é todo mundo tem outro lado. Qual é seu outro lado? Não sei bem o que se passou na cabeça dos publicitários, talvez ressaltar um outro ponto de vista, uma nova oportunidade pruma marca que já foi simbolo de status e esperteza. 

E...

A propaganda mostra um tiozinho fardado pra pelada de fim de semana, dando um chute na gorduchinha - como trocentos milhões de brasileiros. A câmera foca o rosto do tiozinho, putz. Megaputz. A legenda confirma: todo mundo tem outro lado. Esse é o do João Dória Jr. 

Isso mesmo, o cara do movimento cansei. O cara de pastel que organiza e apresenta concurso de cachorrinhos de madame e fica na moleza numa ilha de caras da vida aparecendo vez ou outra com pose de executivo. Esse é o cara escolhido pra alavancar a Blackberry, mostrar a força e sinalizar ao mundo o ressurgimento da marca. 

Nem vou entrar no mérito do que exatamente é "todo mundo tem outro lado" pra quem fez essa campanha. Bater uma bolinha no fim de semana é outro lado de alguém? Outro comercial da mesma campanha mostra um ator da Globo vestido de boxeador e fazendo pose num ringue, isso é outro lado? Fazer boxe na academia? Se o cara for campeão mundial dos médios e eu não tô sabendo aí sim é "outro lado" prum ator. Mas definitivamente hobbys  tão comuns não são "outro lado", apenas completam o lado já visível. 

Qual é seu outro lado? Pergunta a Blackberry. Não sei, pra ser sincero, mas o outro lado, a cara nova da Blackberry parece ser meio afetada e cheia de botox dum playboy vazio.Te cuida Apple.


sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Bola nas costas e amarelada do PT


Lembro que no começo do primeiro mandato de Lula em 2003, era discurso comum entre os petistas (e quem gravitava em torno) a necessidade de rever a política de regulação dos meios de comunicação. Entre uma série de motivos, o que imcomodava mesmo era a concentração do setor em poucas mãos, contrariando inclusive a constituição - como no caso do Grupo RBS que tem quase tudo de televisão, rádio e jornal no Rio Grande do Sul e Santa Catarina - ou seja, mesmo considerando todas as possibilidades, os "receptores não passivos" e etc, um grupo econômico determina o que é dito ou não e como é dito para população (ou boa parte dela) nestes dois estados e isso ainda importa, e muito. E as poucas mãos proprietárias definitivamente não iam com a cara do PT.

Porém a entrevista de Roberto Jefferson na Folha desencadeou o primeiro escândalo do mensalão e o governo dedicou-se mais a sobreviver do que mudar qualquer coisa - e, naquele momento, uma mudança radical na regulação da mídia poderia soar como retaliação autoritária aos que criticavam Lula na imprensa.

A partir do segundo turno com Alckmin em 2006 as coisas mudaram. Qualquer um que acompanhe as notícias nas revistas e blogues à esquerda tá cansado de saber todas as armas usadas pelos grandes veículos de comunicação - as tais balas de prata - pra defenestrar Lula, como fotos de dinheiro, suposto dinheiro em whisky de Cuba,  dinheiro na cueca, , sempre com PT e corrupção na legenda. Até Lula ao estilo gangsta rap apareceu numa foto na capa da Folha tipo mano na correria com a grana dos maurícios. Perderam e Lula ganhou uma força que não tinha e não perderia mais. Poderia, neste momento do segundo mandato, rever a concentração no setor de mídia. Poderia ao menos apoiar as iniciativas populares - como as rádios comunitárias - pra contrapor um pouco a hegemonia das corporações tradicionais. Porém Lula  preferiu, novamente, acomodar, acho que acreditando que quanto mais apanhava mais forte ficava e, com a vitória sobre Alckmin (e depois com Dilma ganhando do Serra) a campanha permanente da imprensa contra o PT - na aparência - já não machucava mais. Tremenda bola nas costas, numa metáfora futebolística tão a gosto do ex-presidente, que ainda vai cobrar a conta do PT.

Bola nas costas que mistura essa sensação de invulnerabilidade de Lula com outras motivações que posso especular aqui. Primeiro um desejo típico dos novos ricos de aceitação no clube dos quatrocentões. O PT ou sua cúpula parece sempre esperar esse momento mágico da aceitação - quando finalmente a imprensa fará o mea culpa e cairá de joelhos diante dos bons números do segundo mandato de Lula, recebendo com lágrimas nos olhos (ainda que de crocodilo) os novos donos do poder, convidados a fazer parte dos clubes de elite onde, se muitos petistas já são habitués há um bom tempo, parecem mais tolerados que outra coisa. E tolerância, diferente de aceitação verdadeira, tem prazo de validade. Né Zé Dirceu?

Segundo, uma amarelada mesmo, no melhor jargão do futebol. Parece mais fácil enfrentar os poderosos quanto se está no poder.  Mas é aí que se tem muito a perder. Deve dar medo aos petistas, colocados agora em posições importantes, levar a cabo propostas das décadas anteriores, ainda combativas e arriscar virar, inevitavelmente, a póxima capa da Veja com fundo em vermelho e um polvo. Deve assustar. Melhor assoviar, bradar indignação nos bares com os companheiros. Fazer o que é preciso pra mudar, nada.

O lulismo - como bem definiu o Andre Singer - não é o petismo muito menos dilmismo  e a série de fatores que provocaram uma intensa ligação entre Lula e as camadas mais pobres da população brasileira - além de setores que já simpatizavam com o PT (mesmo que parte grande da classe média, como aponta Singer, tenha saído da órbita do PT) dificilmente se repetiriam com outros nomes, mesmo Dilma e sua grande populadidade no momento. A aparente invulnerabilidade não vai durar e tende a dminimuir bastante conforme a influência de Lula perder a relevância, não amanhã ou depois, mas não ser presidente da república, quer Lula queira ou não, implica necessariamente em diminuição substancial de influência, mesmo com seu partido e sua protegida no cargo. O PT não é Lula e Dilma não é Lula. Quero dizer com isso que uma campanha permanente da imprensa contra o PT (e depois muito provavelmente contra  Dilma) não vai fortalecer o PT ou Dilma como fortaleceu Lula, a lenda não é a mesma e todo mundo sabe disso.

A agenda do primeiro turno das eleições municipais em 2012 acabou com qualquer dúvida de aceitação,  trégua ou autoreflexão dos meios de comunição que parte dos críticos esperava após a derrota de Serra em 2010. Não só essa autorreflexão não vai vir como o oposto é bem mais provável: sem Lula vão bater abaixo, acima, por dentro, por fora e do jeito que for possível pra enfraquecer Dilma e o Partido dos Trabalhadores. Até Lula, fora do poder ao menos formalmente vai ser enfraquecido. Diante desse cenário a acomodação do PT é vista, por exemplo, na colaboração de parte do partido pra abafar a participação da imprensa na CPI que investiga o Carlinhos Cachoeira ou na disposição dos petistas em dar entrevistas e assinar artigos nos mesmos veículos que se esforçam pra tirá-los do poder. Um espaço legítimo ocupado pela esquerda nos veículos conservadores, dizem os acomodadores que sempre têm algo a dizer. Prefiro pensar em um exercício de ego petista que vai de encontro a necessidade de falsear a pluralidade destes veículos - a conta fica assim: num jornal 10 colunistas batem no PT. As capas todas tem manchetes (como a onbusdman da Folha apontou) enviesadas contra o PT, mas a Marta escreve uma vez por semana e temos a tal pluralidade. E a coisa se repete nos outros veículos - desde que não haja exagero, como mostrar o avanço das políticas de inclusão social sob Lula, que causou a demissão de Maria Rita Khel do Estadão. Na Veja acho que ninguém remotamente ligado às esquerdas participa. Eu é que não vou chegar perto da revista pra conferir.

Dilma começou seu governo entregando a cultura ao Ecad, cortando os poucos avanços de Lula na regulamentação das comunicações e visitando sorridente as sedes da Abril, Folha e Globo (convidada pelo Louro José). Não creio que alguém que encarou a luta armada contra ditadura e ficou anos na cadeia sob tortura possa ser chamada de covarde, mas o debate sobre a importância da cultura é antigo nas esquerdas e Dilma parece ter a visão comum, à direita e à esquerda (parte, ao menos), de que crescimento econômico por si só garante apoio político. A cultura, nessa visão (e que parece determinar a política atual) é assunto menor e vai a reboque do desenvolvimento. Erro grave quando parte expressiva dessa cultura ganha sobrevida graças as "parcerias" com o grande capital através da Lei Rouanet. E uma cultura hegemônica reacionária vai necessariamente redundar em escolhas eleitorais reacionárias - sim, sei que a conta não é matemática, não é exata, mas não é desonesto supor que um ambiente cultural cada vez mais reacionário vai beneficiar, nos momentos de manifestações públicas, como o voto, os que justamente se sentem "em casa" nas capas da Veja e no Jornal Nacional. Se não garante vitória, mantém no páreo muito candidato cuja retórica faz inveja a qualquer general de pijamas num dos encontros patéticos do clube militar.

E esse movimento se dá em dois sentidos: o mais óbvio é a escolha de candidatos abertamente reacionários pelo eleitor - e a roupa fascista vestida por José Serra dá medida dessa escolha. Noutro sentido os partidos de esquerda sentem necessidade de agradar as faixas reacionárias do eleitorado, suavizando seu discuso, amansando e, com o tempo, acovardando-se a cada buuuhh das bancadas ruralistas e religiosas contra propostas minimamente necessárias para preservar o meio ambiente ou acabar com o uso de um livro de mitologias da antiguidade como legislador do que pode ou não pode pra "família brasileira". Covardia é a chave aqui. E nisso o PT tem se mostrado sempre solicito, aceitando, por exemplo, que os adeptos do livro mitológico obstruíssem a distribuição de material contra homofobia pelo Ministério da Educação. A manobra covarde deu status e importância ao pastor Silas Malafaia, homofóbico ao extremo e "vencedor" na campanha que moveu contra o que chamava kit gay (esse povo acha que qualquer coisinha faz alguém "virar gay", eu heim, que medo, coceira no forevis diria Muçum).  O Malafia fortalecido pela covardia do PT agora berra sua raiva pra destruir...o PT e Haddad em São Paulo. Bola nas Costas é exatamente isso.

Enquanto isso o governo do PT continua com sua Polícia Federal ainda dedicada a fechar rádios comunitárias e a garantir o monopólio da informação pra quem quer acabar com o PT. E o problema aqui, pra mim, não é o PT ou o fim do PT, mas os ataques ao partido são justamente ataques dos setores hegemônicos a qualquer tentativa de mudar os princípios da cartilha (neo)liberal que construíram o caráter da mídia e seus jornalistas e ainda pautam as coisas aqui, mesmo depois de tudo ter dado errado no mundo por causa dessa cartilha. Conforme relatório da SECOM do governo federal é o próprio governo petista que dá sustento a mídia hegemônica com os gastos de publicidade do poder público e das estatais. Parabéns, dar a outra face não está no tal livro de mitologia? Dar a outra face e ainda pagar pra apanhar mais já cai na esfera do fetiche, da roupa de couro e chicote. Aos que argumentam que essa escolha é técnica, tomada conforme dados de níveis de audiência ou vendagem blablabla,  não é bem assim e é justamente a concentração do setor que se traduz em audiências altas, um circulo viciado que com internet e outros meios poderia ser quebrado. E sobre os dados que justificariam os gastos com publicidade em determinado veículo, conheço três pessoas que não conseguem parar de receber Veja, e de graça, já tentaram cancelar a assinatura várias vezes e não conseguem. Muitos outros devem estar nessa situação. Com certeza estão na conta de tiragem da revista usada pra justificar a publicidade do governo federal e das estatais.

Leio na manchete do UOL que uma segunda fase do julgamento do mensalão vai investigar a relação de Daniel Dantas - o cara da privataria tucana que ninguém nunca fala na grande imprensa - com o... PT. Bem feito de novo, pro partido aprender que se ficar apanhando quieto vai acabar, junto com o PFL, nas listas de extinção (quem imaginava o PFL extinto 15 anos atrás?).  Não apanhar quieto neste caso não é ficar berrando contra a imprensa nos comícios, muito menos fechar jornais ou perseguir jornalistas, mas fazer de fato uma reforma na regulação do setor, acabar com a concentração, fortalecer projetos comunitários ao invés de criminaliza-los, promover formas de democratização e acesso a filmes e livros ao invés de colocar o Ecad dentro do governo, oferecer conteúdo alternativo e de qualidade sem preocupação com audiência na TV Brasil.... Esse seria um destino muito mais inteligente pra imensidão de dinheiro público até aqui tradicionalmente torrado com campanhas publicitárias desnecessárias e que sustentam os donos da mídia. Oito anos de Lula e dois de Dilma não indicam quase nada nesse caminho, só a amarelada de sempre. Quando a derrota grande vier e a fúria eugenista da imprensa agir livremente pra "limpar" o cenário dos políticos petistas, quem teve toda chance de desconstruir esse cenário vai ficar chorando pra ninguém.

PS - Cabe aqui uma emenda. Não me importaria nem um pouco com o fim do PT se este fosse determinado à esquerda, por exemplo com um novo partido que representasse melhor os movimentos sociais, os trabalhadores, as minorias e os miseráveis - que não tremesse a cada gritinho histérico dado pelos reaças sempre que um movimento em direção a justiça social é sequer proposto. Não vejo isso possível tão cedo, infelizmente. A oportunidade histórica está(va) com o PT e sei com certeza que seus críticos nas corporações de mídia querem exatamente o que eu não quero: acabar com os movimentos sociais, criminalizar a pobreza, explorar as minorias pelo ódio ou pela ridicularização. Se o PT já não é meu partido há muito tempo, é quem ainda pode impor - pela expressiva força eleitoral conquistada - aos donos de tudo uma derrota muito mais profunda do que um ou outro revés eleitoral. Mantidas as estruturas de dominação (como a citada, repetida e recitada concentração da mídia em poucas corporações) cedo ou tarde os donos de tudo vão poder contar novamente lá no planalto com um membro do café society - desses legítimos, com DNA de rico, como diriam numa entrevista descontraída pro Amaury Jr (o do botox, não o da privataria), copo de whisky na mão, frases sem sentido de quem bebeu muito e o riso meio débil de quem sabe que sempre vence no final.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Esquerda e direita

Lula disse que depois de certa idade continuar "de esquerda" é tolice - ou algo assim. Pode ser. Talvez pra demonstrar isso escolheu pras vagas no Supremo Tribunal Federal um monte de brucutus de direita. Esses, que certamente não acham tolice ser de direita com certa idade, montaram o circo do mensalão. O mesmo STF que tá cheio de processos encalhados (e que tá deixando prescrever, olha só, o mensalão do PSDB) pôs o mensalão na frente e marcou o julgamento, tão ao gosto da grande imprensa, exatamente no começo da disputa pelo primeiro turno das prefeituras - chegando ao caso específico do belzebu da mídia, José Dirceu, exatos dois dias úteis antes da votação. É, a direita não acha tolice ser de direita e Lula vai continuar sem entender a oportunidade que perdeu.

PS 1 - Tudo bem que achar alguém, digamos, progressista no quadro de candidatos ao STF não deve ser fácil.

PS 2 - Falando em oportunidades perdidas, Lula aparece indignado na imprensa com o cancelamento do debate na Globo de São Paulo, acusando manobra pra prejudicar seu candidato Haddad - que já tava recebendo a conta de todo bafafá diário do julgamento do mensalão no STF. A imprensa ou seus donos não acham tolice ser direita, mas a isso voltamos num post maior.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Bond versus Bauer


Uma das alegrias do ócio é poder me dedicar com empenho a certas atividades impossíveis em épocas de fechamento de texto. Munido de uma internet rápida (de uma pequena empresa local, muito mais rápida e barata do que qualquer velocidade fodona da Net) e a Netflix, pude rever em sequência - e em HD - os filmes do James Bond. Já tinha visto todos, mas fora de ordem e boa parte deles há muito tempo. Aproveitei também pra terminar de ver uma série da época que tinha TV a cabo e a FOX não dublava tudo, 24 horas. 

Comecei a ver as duas séries - cinematográfica e televisiva - meio por acaso, mas ainda nos meados de dois mil quando assisti pela primeira vez as correrias sem fim do Jack Bauer já tinha atinado pra esse status do Kiefer Sutherland virado num James Bond completamente obcecado, um psicopata desprovido de charme e qualquer vestígio de humor. Não por acaso o psicopata sem humor também é o próprio Bond a partir de Daniel Craig, numa reapropriação da cultura sisuda da ex-colônia em prejuízo do velho humor debochado do ex-império.

Revendo os filmes antigos deu pra lembrar como nada era levado a sério. Principalmente o período de Roger Moore como o espião do MI6. Em muitos momentos o super herói escapava das armadilhas cartunescas como num episódio do scooby doo - numa cena clássica Bond é deixado numa ilhota no meio dum rio de jacarés e foge correndo pisando sobre os bichos. É, exageravam no deboche, quase chanchada, meio como o seriado do Batman dos 60, mas, como no seriado em comparação aos filmes do homem morcego de hoje, é meio estranho quem leva tão à sério um cara vestido de morcego combatendo o crime ou um superespião que ganha todas as mulheres e nunca morre. Autodeboche é sempre uma virtude e Jack Bauer nem desconfia do que se trata. 

O único humor do agente de contraterrorismo americano está exatamente na absoluta ausência de humor. É humor involuntário, acho que só funciona pra quem assiste temporadas em sequência e pode acompanhar a fúria de Jack sempre pronta a arrancar "informações necessárias", custe o que custar. Terroristas, supostos terroristas, não terroristas, amigos, irmão, crianças, cães, gatos, elefantes, cedo ou tarde todos vão sentar numa cadeira diate de um furioso Jack Bauer pra confessar algo, qualquer coisa. Um fio desencapado, literalmente. 

Nestes momentos o pastiche sai das peripécias de Roger Moore pra encarnar na seriedade com que é tratado um psicopata como Bauer. Não deixa de ser curioso que, depois de participar das últimas temporadas do Rambo da era Bush Jr, um dos roteiristas de 24 horas, Alex Gansa, tenha conseguido realmente embaralhar as coisas entre certo e errado com alguma profundidade na série Homeland de 2011. Voltando pra série de Jack Bauer, a coisa funcionava assim: vamos construir um cenário ultraconservador com uma pitada aqui outra ali de dúvidas liberais pra mostrar nossa "complexidade" e legitimar a insanidade do Bauer. Falando assim parece até a Folha de SP. Então a unidade de contra terrorismo podia fazer qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, pra lidar com ameaças, mas tudo bem, os presidentes ao longo das diversas temporadas eram negros (dois) ou mulher, todos bem intencionados (exceto quando os vices assumiam, geralmente comprometendo a pureza dos votos). Toques democratas em ações republicanas. Nisso, aliás, foi profético com Obama. Claro que em 24 horas a ameaça é sempre real, portanto, Jack é obrigado a fazer tudo que faz, está sempre certo mesmo quando erra. Sabemos que fora da TV as ameaças nem sempre são reais, armas de destruição em massa não são armas de destruição em massa, mas os princípios - medo e pânico permanentes - funcionam pra fazer tudo que fazem e a existência duma prisão como Guantanamo resume bem isso.

Em comum, além do crachá de um serviço secreto, pouca coisa, mas Jack e Bond partilham do pavor ocidental do uso pela oposição de armas nucleares em seus respectivos territórios de proteção. Bond, no cinema ao menos, nasce sob a crise dos mísseis em Cuba. A chance de tudo acabar num botão é o verdadeiro inimigo, o que realmente movimenta o espião britânico. Bauer nasceu do 11 de setembro e a paranóia com o ataque dentro dos EUA por forças não convencionais e armas idem, principalmente nucleares. Não saber quem vai atacar é a virtude explorada pela série e o que movimenta cada temporada com as constantes voltas e reviravoltas - as vezes dentro dum mesmo capítulo o inimigo muda completamente e o ex-rival passa a ser um dedicado aliado enquanto aliados revelam-se traíras malvadões, numa demonstração clara da dificuldade de entender a complexidade dos motivos. Mas, como um noveleiro que nunca fui, acabo curioso pra saber o que se propõe para conclusão na sequência da reviravolta-de-todo-final-de-episódio. Perde-se complexidade, ganha-se na agilidade (meio desonesta, como suponho que seja no caso das telenovelas daqui). 

Agilidade, aliás, é a força da série, pro bem ou pro mal. O tal Tempo Real (é uma marca registrada mesmo, real time) que se propõe a contar o dia de Jack hora a hora como se estivesse acontecendo, sem avanços ou retrocessos, foi uma das novidades introduzidas pelo seriado, mas também uma limitação muito grande. No começo era legal ver horas e minutos passando corrido numa disputa frenética de Bauer contra algum deadline, mas, temporada após temporada, a coisa ficou meio ridícula. Como tudo tinha que caber num dia, num único dia, coisas que levariam meses acontecem em minutos. Numa das temporadas, acho que a penúltima, a filha da presidente resolve encomendar o assassinato de um prisioneiro que vai ser posto em regime de delação premiada e, portanto, receber nova identidade. O prisioneiro já está escondido e sob forte proteção, no entanto, poucos minutos depois do primeiro telefonema pra encomendar o serviço o atentado já é executado. Em qualquer telefonema, sempre de vida ou morte, de Jack pra pobre Chloe (sua suporte técnica na sede da agência) informações que levariam dias são exigidos em segundos. E atendidos. Mas enfim, são tantos exemplos dessa liberdade com o cronômetro que ou você releva ou não assiste nunca mais - isso me lembra quando fui assistir ao Godzilla do Emmerich e um cara na poltrona de trás ficava indignado o tempo todo (em voz alta) com os furos do roteiro. Uma hora não aguentei e virei pro cara: "meu, é um filme dum dinossauro correndo pra lá e pra cá em Nova Iorque, e daí se a arma tem capacidade de sei lá quantos tiros? Se um carro não conseguiria parar dessa forma? Relaxa cara, ou sai". É exatamente assim com o tempo em 24 horas.

Sobre Bond, espero que com outro ator retome logo a capacidade de rir de si mesmo, ou vai ficar datado. Com o Craig acho difícil, ele já deu a cara que queria pro espião (pra ser honesto, se eu tivesse pegando a Eva Green e tirassem ela de mim daquele jeito ficaria realmente muito puto). Um Bond  muito sisudo e agindo sempre com obstinação, sem pausa prum champagne com uma bondgirl meio pelada vai ficar preso a um espaço muito curto na linha de tempo da cultura da própria série, exatemente como o Bauer do seriado, produto típico de um evento. Que voltem logo as bondgirls e o autodeboche e que Bauer seja posto numa camisa de força e rápido, afinal Sutherland quer um filme pro cinema com o personagem.

PS - Sobre dublagem, muita gente boa apontou o elitismo dos inimigos de filmes e séries dubladas. Imagino mesmo as várias manifestações pedantes desse povo nos feices da vida, estilo classe média sofre, classe C tem que ir por inferno.... Mas eu mesmo não consigo ver filme ou série dublados. Primeiro porque acho importante o trabalho de voz do ator/atriz e a dublagem, por melhor que seja, perde totalmente isso. Como não vejo nada dublado desde os 90 não sei como anda, mas nos 80 e 90 eram 4 ou 5 dubladores revezando todos os atores principais. Quase todo mocinho falava como o He-Man ou o Bruce Willis. Os sotaques de qualquer personagem, dum escocês ao caipira estadunidense variavam do carioquês ao paulistanês e daí vem o segundo motivo deu não ver filmes dublados: gosto de acompanhar as coisas da cultura pelo que vejo no cinema ou séries. Realmente gosto de ver um filme que se passa na Alemanha com gente falando alemão, de ver um personagem iraquiano dum seriado com algum sotaque iraquiano, mesmo um sotaque canastrão. E se hoje consigo ler razoavelmente no idioma de Shakespeare não é por nenhum fisk, CCAA ou coisa assim, mas por te visto toneladas de filmes dos 14 aos 20 anos (graças ao video clube e aos VHS não originais). Enfim, se boa parte prefere os dublados beleza, mas poxa, mantenham opções pro som original, de madrugada que seja na TV, sessões alternativas nos cinemas. Esses dias fui  num cinema de Maringá e não tinha nenhuma sessão com som original, pra nenhum filme. Tudo dublado. Se bobear com a voz do He-Man ou Bruce Willis.

PS 2 - Falei que as reviravoltas de 24 horas eram meio desonestas, explico. Não mencionei a telenovela por acaso, lá sabe-se desde o primeiro capítulo que muita coisa vai acontecer pra, no final, o mocinho acabar na igreja com a mocinha. Na melhor tradição de mudar pra ficar na mesma de Lampedusa. As reviravoltas na trama de uma temporada de 24 horas são tão obrigatórias que ficam previsíveis. Pra piorar, essas mudanças radicais na motivação dos personagens não resistem a uma reprise. Quase todo mundo que viu Sexto Sentido foi ver de novo pra provar que o final era furado, mas não era. Revisto o filme, o roteiro dava todas as pista pro final e logo uma leva de filmes tentou reciclar a "surpresa no final" com resultados muito ruins, principalmente porque quando revistos os roteiros davam pistas enganosas (e não no bom sentido do suspense), trapaceando mesmo, só pra provocar um ohhh no final. As reações dos personagens de 24h, quando sozinhos (tipo após desligar um telefone) continuam falsas. Um personagem que está falsamente preocupado com outro quase chora após saber que aquele está em perigo ou pode ter morrido. Isso sozinho, sem ninguém pra precisar convencer. Anunciada a conversão óbvia do personagem, mesmo que só pro espectador, as atitudes do personagem mudam bastante também, de repente já não é preciso fingir pra câmera. O irritante excesso de compaixão de antes agora vira um irritante olhar frio do tipo sou um dos malvadões fodões e te enganei fingindo pra você, espectador.

PS 3 - A melhor coisa do seriado do Jack Bauer é a personagem Chloe O'Brian. Os ataques terroristas podem falhar mas a cara emburrada da Chloe nunca deixa na mão (põe no chinelo a atleta americana que não ficou muito feliz com a medalha em Londres), e a expressão amarrada vem acompanhada de uma absoluta falta de habilidade pra se relacionar com seus colegas de trabalho. Chloe é a verdadeira  marca da série.

Chloe explicando pro ex-atual-marido porque vai fuder com a vida de todo mundo e principalmente a dela pra salvar o Jack Bauer pela milésima décima quinta vez e em troca não receber nem um "valeu aí".


Mckayla Maroney mostrando que o importante é competir e tá muito feliz com a prata.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Enfia o microfone em outro lugar

Se todo mundo parece meio incomodado com os palavrões berrados pelos técnicos nas partidas de futebol transmitidas pela Globo/SporTV, pra quê botar o maldito microfone ali então?

Ano após ano a coisa se repete, putaqueopariu, tomar no cu, porra, caralho são tão ouvidos nas transmissões de futebol quanto cruzamento, passe, chute, finalização. Narradores e comentaristas meio que desconversando, mudando de assunto pra falar por cima dos palavrões ouvidos com nitidez ao fundo. Depois dos jogos aqueles rituais puritanos, pessoas reclamando, mandando cartas pra TV. Se os palavrões não me incomodam, alguém berrando o jogo inteiro torra o saco. Somado aos berros do narrador então. Realmente não faz sentido um microfone ali na boca do técnico, comprometendo inclusive a única utilidade do nosso popular repórter de campo que poderia, entre as as inúmeras bobagens que costumam falar ao pedir (com insistência) a palavra, resumir o que está dizendo o técnico pros jogadores do time. Ao invés de tirar a porra do caralho do microfone dali, narradores perdem tempo pedindo "educação" aos técnicos - que, por sua vez, deveriam mandar os narradores tomar no cu pra poderem trabalhar em paz. Como não escuto técnico berrando nas transmissões de futebol fora do Brasil, imagino que esta, como o repórter de campo, seja uma contribuição só nossa para dar ao preguiçoso sentado na poltrona assistindo o jogo pela TV um pouco do "clima do estádio", por algum motivo que desconheço tão valorizado pelos narradores nas transmissões esportivas. Em breve a Globo vai providenciar filas pra entrar, sacos de mijo jogados na cabeça, balas de borracha e safanões da PM, tudo no conforto da sua sala. Tem coisa que é melhor deixar lá no estádio.